segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

Nova Alvorada anunciada pelo Anjo domenical das asas coloridas - para Larissa Minghin

Em um dia de calor cai das asas de meu xexéu de bananeira.
Sem apelo ou solução cai de uma altura vertiginosa.
Era queda fatal e irremediável,
O chão pedregoso e poeirento chegava cada vez mais perto.
A prata já lampejava nos meu olhos,
Eu já podia ouvir meus ancestrais abrindo a porta profunda
E a mão terra florir seus brancos jasmins para mim.
Foi então que um anjo com asas de ceda,
Com tantas cores que não sei nem como definir,
Me pegou nos braços mansos,
Me cantou seu canto celestial
E me livrou daquele mal nefasto.
Ele me falou que Sol diferente brilhará no céu,
E enviará o dragão do Tempo para curar qualquer ferida.

quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

Jornada de Mar

Peito ao Mar.

O Tempo já é cor de maduro.

Vou rumo ao Novo Mundo

Minha Santa tem meu caminha para Clarear.

 

Eu, marujo sem bandeira

Me lanço com minha Nau Catarineta

Neste tigre de barba azul

Filho da Terra e devorador de sonhos.

 

Em meu caminho muitos perigos.

Eu não posso parar,

Pois minha jornada é epopéica.

Nem a poderosa Brusaicã poderá me assustar.

 

Mil canhões apontam de minha Nau.

Não tenho uma colossal tripulação,

Mas ando com minha Ciganinha

Que usa uma saia azul que foi prenda minha.

 

Meu caminho é logo

E o Tigre está acordado.

Vem minha Ciganinha,

Me leva nos teus braços a minha Nau.

 

A chuva pinga pinicando a madeira,

Uma nuvem esconde o Sol.

Abana a saia minha Cigana

Para nossos cainhos Clarear.

terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Cantiga de Rei

Um, dois, três

Falarei para vocês.

Eu tenho uma bela Coroa

Sou um belo Rei.

 

O meu trono é magistral,

É real e imponente.

É cravejado de estrelas

Que brilham constantemente.

 

O meu cetro é divino,

É fino e decente.

É esculpido por artesão

Em meu sertão quente.

 

Um, dois, três

Falarei para vocês.

Eu tenho uma bela Coroa

Sou um belo Rei.

 

A minha armadura é bela

E nela se aparentam

Marcas de fogo e brasa

Que a mim muito contentam.

 

Minha montaria e ligeira,

Faceira e veloz.

Meu nobre Castanho

Criado no aveloz.

 

Um, dois, três

Falarei para vocês.

Eu tenho uma bela Coroa

Sou um belo Rei.

 

Sou Rei de caça,

Da praça e do mar.

Destemido e zeloso

Tenho Reinos a conquistar.

 

Com meus Pares de França

Tenho andanças pelo mundo todo.

Cordão azul e encarnado,

Sangue Ibérico e sangue Mouro

 

Um, dois, três

Falarei para vocês.

Eu tenho uma bela Coroa

Sou um belo Rei.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

sábado, 6 de dezembro de 2008

Santo anjo sem Senhor

Meu vermelho Anjo
Que tem um cacho esplendoroso onde bato meu olho,
De saias longas e esfarrapadas,
Sem seus chinelos de cristal,
E com os olhos reluzindo.
Escute essa Oração que não fiz para você.
Tu que endoidas os demônios decaídos
Com teu lundu negro tapuia
E os homens deprimidos também.
Gelai por mim meu anjo.
Ho santo anjo sem Senhor
Minha Zelação, meu guardador
Me enrosca nas tuas saias
E me leva além,
Além do onde já estou.
Pelos século e séculos
Amém

sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

Alvorada

Me sorria um sorriso gentil

Que te convido para pintar um teto.

Escolhi as tintas, vamos pintar uma noite

Dessas com muitas estrelas qualhando o céu.

 

Mas se o Cruzeiro do Sul não te agradar

Podemos pintar uma Aurora.

Tenho tinta amarela e laranja,

Uma para sorrir e outra para apaixonar.

 

Prepare tudo sem demora

Que vou uma surpresa buscar.

Vou na casa do venderinho buscar chita e celofane

Para ornamentar nosso amanhecer.

 

O sabiá esta na varanda afinando a cantoria,

Azulão e concriz vieram ajudar.

Nosso dia está ficando belo e pronto

Num imaginário faceiro a imaginar.

 

Vista seu manto azulado coberto de flores

Que vestirei minha armadura Moura cravejada de estrelas.

Me deite em teu colo e me mostre carinhos

Pois no fim o Sol vai nascer e vamos ver juntos a Alvorada.

Empariados

Ah, como seria bom se nós vivesse empariado,

Assim juntinho, lado a lado

Nas intemperanças e dádivas desse mundo embolador.

Mas por uma gaiatice Divina nós não vevi.

Então eu fico mancomunando no meu imaginário

Situações em que nós vivesse pregado.

 

Imagina se nós fosse dentada de onça do lajedo,

Tu a dentada e eu o mordido.

Tu com a boca em eu e eu me acabando na tua boca.

Mas se isso fosse sanguinolento demais pra tu

Nós podia ser outra coisa.

 

Nós podia ser beira de rio,

Tu a corrente forte e eu um surubim pra tu me guiar.

Tu me levando nos teus braços e eu deixando me levar.

Mas se isso fosse fácil demais pra tu

Nós podia ser outra coisa.

 

Nós podia ser ferroada de fuzileiro maribondo,

Eu o ferão pra penetrar e tu a pele se abrindo para eu.

Meu ferrão fazendo parte de tu e tua pele fazendo parte de eu.

Mas se isso fosse dolorido demais para tu

Nós bem que podia ser outra coisa.

 

Nós podia ser um carro de boi,

Eu o carro e tu os bois para me levar por esse mundão a fora.

Tu levando pelo caminho e eu abraçado no teu cangote sendo levado.

Mas se isso fosse lento demais pra tu

Nós podia ser outra coisa.

 

Nós podia ser uma Cavalhada sertaneja dos doze pares de França,

Tu do cordão azul e ibérico e eu do cordão encarnado e mouro

E nós dois cavalgando juntinhos.

Mas se isso fosse demais pra tu

Nós podia ser outra coisa. 

 

Nós podia ser feito coceira de urtiga,

Eu a unha pra me esfregar em tu e tu a queimação pra se ouriçar em eu.

E se isso tudo fosse demais pra tu

Só uma traquinagem divina para juntar nós.

sábado, 15 de novembro de 2008

O Velho Galego visita terras do Leste

Sou o Velho Galego de Sumé.
Andarilho não nego não.
Corro montado em meu Castanho,
Descendente direto do legendário Pedra Lispe,
Meu fiel alazão.

Ando feito passarinho em revoada.
Meus pés se movimentam pelo chão.
Já passei por chão verde que não da semente
E pedregoso, poeirento e viçoso.
Vi quase todas as maravilhas desse e do outro mundo.

Uma das maiores maravilhas que vi
Foi em terras do leste.
Uma luminosa estrela de três Flechas
Que os anjos, com excelência magistral
Sustentavam no pretume celeste profundo do céu.

Ela estava montada na zelação
Com os cabelos enfeitados de flores
Cavalgando pelo céu de além-mar
Sem pena e sem penar,
Certeira feito a pontual Caetana.

Minha Virgem Maria que apavoração.
Se parto eu morro lá fora,
Se eu fico morro de não ir.
Me proteja faca de duas pontas,
Me ilumine meu padroeiro santo Fuzil.

sexta-feira, 19 de setembro de 2008

Revoada - Para Carol Pires

Nesse mundo tudo se movimenta
E o implacável Tempo dá o tempero.
Com o tempo, tudo que o Tempo dá
O Tempo sem avisar vem e toma.

A Vida passa montada no vento
Que rasga o horizonte
E a Pipa branca no céu
Fazendo movimento mostra a direção.

Voa amiga Patativa
Que o mundo tem que embolar.
Vá longe fazer suas piruetas
E em outro puleiro cantar.

Se o Tempo implacável esfriar
E tomar o que te deu
Não chore amiga pequenina
Que Maria deixou um ninho bento.

sábado, 6 de setembro de 2008

A Partilha do pão. Cosme e Damião esperando a Fortuna

Os cavaleiros Solares açoitavam suas montarias
Com suas esporas de ouro e tabicas Fumegantes.
Os cascos dos corcéis riscavam línguas de Fogo aladas
Que Ferviam as pedras do lajedo.

Um par de irmãos santos, Cosme e Damião,
Penitentes, derramavam lágrimas agrestes.
Transpassados na alma e na Carne
Esfriavam a pedra com as gotas do pranto.

A cavalaria Ignorava e passava
Em um silêncio ensurdecedor e sepulcral
Refletindo os Lampejos dos cristais e do dourado.

Em meio a toda dor, um sorriso, um alívio.
Defronte a dentada da Onça celeste
Maria divina divide o pão e roga pela Fortuna.

segunda-feira, 18 de agosto de 2008

Picadeiro

Nós bem que poderíamos fugir com o circo
E viver de amor mambembe.
Eu de palhaço, tu de trapezista.
Lá vem você flutuando, vestindo farrapos de nuvens,
Enquanto eu ficava lá de baixo dando trupicão
E molhando o chão com gotas de suor e melancolia.

Desce trapezista malvada.
Vem enxugar essa molhadeira.
Me empresta um farrapo dessas nuvens,
Um que cubra um pedacinho leviano,
De pele ou de pelo
Para satisfazer um coração mundano.

E se faltar elenco
Eu poderia ser o mágico ladrão de corações,
Que colocava cartas de copas nos ouvidos das donzelas desavisadas
E você poderia ser a fenomenal engolidora de espadas.
Iríamos arrancar suspiros,
Eu de amores e você com sua habilidade com as lâminas.

Assim nosso circo viveria de risos, lágrimas e amores.
Nossos corações viveriam coladinhos
E seriamos arteiros fazendo trela
Com os corações alheios,
Com os sonhos verdadeiros
E com os olhos devoradores.

sexta-feira, 25 de julho de 2008

A briga certeira

Afe Maria, vou contar uma situação
Que se passou lá pelos lados do Araripe
Em noite estrelada
Típica do Sertão.

Bem na boca da noitinha
Quando as cigarras já cantavam suas cantigas noturnas,
Trovão fiel latia no fundo do terreiro
E o querosene da lanterna se acabava.

Cem bilhão de sapos cururu se amoitando
Tentando pegar o dobro de bilhão de mariposas avoando.
Trezentos pares de ziguezigue dispareados virados numa gota
Barruando sem dó nem piedade numa parede frienta e malvada.

Doda de Dedé vinha subindo a ladeira já meio bêbado
Enquanto uma vira-lata perversa tentava com empenho
Morder com vontade o mocotó
Do desprevenido embriagado.

Era uma mordidagem que não tinha fim.
Foi dentada, chute de bico, largada de mão, mordida da orevlha.
O cacete era dos grandes.
Bêbado e cachorra embolaram na ladeira atá a venda de Serafim de Bebé.



Foi ai que a coisa piorou.
O barulho da cachorrada foi tão grande
Que a vizinhança foi se acordando.
O povo se largou para o meio da rua para ver o que se passava.

Gemido, latido, rangido de dente, bufada de venta.
O bêbado e a cachorra não paravam com a galinhagem,
Os dois já estavam só no farrapo.
Aquelas alturas mais de noventa riscadas de chão marcavam a rua.

Havia se passado umas trás badaladas da matriz
Quando o que já era feio infeiou de vez.
Correndo lá das bandas da feira de Boi Neném, lá de riba da ladeira,
Vinha uma figura abolotada, cheia de rolo na cabeça, vestida com mais de cem papoulas.

Imagine só o mal assombro .
Era um par de havaiana nos pés. Uma de cada cor. Amarela e azul.
Certamente eram do filho pequeno ou roubada de um defunto menor.
Sobrava um fura bolo na dianteira e mais de meio maior de todos no calcanhar.

Já tinha pra mais de vinte desocupados fazendo apostas.
Uma banda que apostasse na cachorra, oura banda apostando no bêbado,
E teve uma outra facção que quando viu a velhota vindo na carreira
Apostou que ela era dona e reclamante da cachorra e se escapuliu daquela rinha.



LIBRUINA, berou a mulher que tava suando feito tiradeira de espírito.
A cachorra largou de imediato
Um bife que tinha arrancado das costas de Doda
Que ainda estava meio empenado e de guarda armada.

Meu Jesus, assombrou-se a senhora
Quem danado fez isso com você?
Interrogou, vendo a cachorrinha
Toda esfolada de dentada e bufete.

Não chame por santo nenhum não dona.
Falou o bêbado abusado.
Quem descangotou esse filhote de maribondo fui eu.
E terminou a fala aprumando a carcaça e se equilibrando no calcanhar.

Olhe aqui seu desqualificado.
Falou a mulher que largou a cadelinha no chão e colocou as mãos nos quartos feito lavadeira de rio.
Quem é o senhor pra levantar essa mão cheia de dedos na minha cachorrinha?
Eu costuro seu palito no cacete seu gaiudo sem vergonha.

Pronto, agora foi que lascou.
Uma onça velha e mal acabada
Pra tomar as dores de uma miséria dessas.
Só pode ser piada ou agouro de mouro velhaco.



Quando o bêbado falou isso a mulher invocou uma Gira.
Seu desenfeliz. Eu sou pior que pingo de superbonde pingado no branco do olho,
Sou feito dentada de de mula com febre.
É melhor o senhor segurar as calças e prender a respiração.

Rapidamente, mais rápido que imediatamente, veio a resposta.
Se desanime que sou comando de fuzilaria entrincheirado na jurema.
De um apito de meu sopro a senhora leva tanto pipoco que não saber de onde veio o toró de tapa.
Na escola da valentia tive nervura exposta e deixei seu superior desacordado.

Se a senhora tem amor ao seu couro
Guarde logo essa sua língua bifurcada,
E volte do catimbó de onde veio.
Besouro Cordão de Ouro foi meu mestre de pernada, gingado e safadeza.

Triste do senhor se pensa que me bota medo.
Eu fui criada na lei do cangaço.
Sou natural das Serras Talhadas, de céu azule das noites frientas.
Sou prima legítima de Virgulino Lampião. Eu enfio meu dedo polegar onde suas costas muda de nome só para te desmoralizar.

Umas oitenta pessoas já estavam no meio da rua pra ver a briga e tinha mais umas trinta nas janelas.
Juntou mais gente que tropa de jumento da Borborema.
Foi ai que a coisa desandou.
A bandoleira deu um murro na boca do bêbado que choveu pivô e molar três dias naquelas terras.

Vendo que sua situação não tava das melhores
Doda resolveu amarrar a camisa.
Deu pernada e rasteira, cabeçada e cambalhotas.
A briga ficou bonita, parecia mais atração de circo da capital.

Ximbo Cabeção gritou na beira da arrelia
Alertando para o perigo iminente,
Pois duelo de cangaceira e capoeira bêbado
Ou acaba na cadeia ou termina em morte.

Zunido de bala foi o que se seguiu ao alerta do cabeçudo.
O povo abriu na carreira. Nem Libruina ficou.
A dupla briguenta ainda estava encangada no tabefe e na dentada
Quando chegaram os volantes que acabou com a festa e levou os briguentos para o xilindró.

segunda-feira, 7 de julho de 2008

Feira de Santo

O sol já se mainçava,
Devagarinho como quem espreguiçava de uma rede.
E uma chuvinha chovia morninha mornando a terra que já esquentava.
Os homem já se iam trabalhando, amuntados numa barra forte deselegante, mascando as marcas de uma vida por viver,
E Maria já se vinha suspirando, cheia de graça, levando numa trouxa o sonho dos sonhos por sonhar.
No meio do povarel tinha um sujeito magro, esconchavado, vestido de casaca que jurava que era santo,
E no sovaco levava um manual, que segundo ele, era de santidade.
O livro já tava meio encardido e descascado, cada vinco era feito marca na mão de lavadeira de beira de rio.
O santo dizia que era mais santo que qualquer outro santo, e que de milagre ele já era pós-graduado e doutor.
E pra provar sua santidade esculhambava, maldizia, estirava língua e dava dedo pra qualquer outra divindade desse ou de outro mundo.
Chamava de cuzeiro, emprestador de farinheiro, esfrabicador, ladrão, papa hóstia, roubador de moeda de cego, filhote de catraia mar feita
E qualquer adjetivoro que pudesse rogar contra a santidade alheia.
No meio do falatório todo, durante os agrados verbalizados
Num te conto o acontecido rapaz!
Num é que outro santo veio reclamar de sua parte.
Foi juntando gente, parecia até romaria de padre Cícero,
E os dois santos lascando o pau no meio da pista.
Um que contasse mais milagre que o outro.
Um andou por riba d’água em Sairé,
O outro levantou alejado em Bodocó,
Vinho virou água em Sumé,
Vaqueiro vestido de biquíni em Mossoro,

E depois dos milagres vieram as penitências.
Nunca vi dois miseravi pra sofrer tanto,
Só de chibatadas contem mais que as que Jesus levou dos centurião perverso.
E caco de vidro?
Tinha um que chupava no café da manhã pra ganhar um pontinho na fé,
O outro pingava cera de vela quente no olho pra num pecar com a vista.
O primeiro, na safra de eleição, aturou falatório de comício e candidato caluniador.
Eu sei que de judiação em judiação os santos iam se invocando feito galo de briga, e riscando os pé no chão feito boi brabo.
Até que Tonha boinha, de que boinha só tinha o nome,
Arretosse e disse:
Home, veleime, nunca vi tanto sofrimento e amargura,
Será que vou ter que ouvir, uma hora dessa da manhã, esses puto falando essas angustura?
Foi nessa hora que Penha de Gerar tomou partido na fé e gritou:
Cale a boca filhote de serpente corre campo,
Que pra num gostar de peleja de santo só tendo parte com coisa ruim
Ou então vive de fornicar com o tinhoso.
Ai foi que lascou tudo,
A briga de santo virou bate-boca de meio de fera com riscado deputadal.
Popeline, viscose e crepe! Gritava Bio de Zezé.
Os santos se ininharam no bufete, as beata se rasgaram na unhada.
Olha o peixe fresquinho. Tem tilapia, surubim e traira.
Há desinfeliz, tu magoou minha unha encaicada.
Ferro velho, jornal e garrafa.
Venha, eu sou rim feito araldite.
O tumulto foi ficando grande e o pau cantava.
A coisa só parou quando os volantes apartaram o engembrado
Tonha Boinha descadeirada, Penha de Gerar toda relada
E os santo descangotado.
O barulho foi grande feito estória de cantador
Essa foi a primeira vez que de tanta fé
Vi dois santos e duas beatas
Ir bater num quartel.

quarta-feira, 9 de abril de 2008

Futebol Clube Olaria Apresenta: A grande peleja de Deus contra o Diabo. O amistoso matutal!

Futebol Clube Olaria Apresenta:
A grande peleja de Deus contra o Diabo.

Chegando na cidade já dava pra ir vendo
Uma correria sem tamanho que já tava acontecendo.
Nem a falta de um pensamento no pensamento
Poderia pensar numa coisa tão medonha daquelas.
Arrepare no acontecimento:
Lá pras bandas de Zé do Gás, três ingazeira depois da casa de Maria Qua-qua,
Bem onde Bico de Lacre bebe leite de aveloz,
Tem uma várzea malacabada,onde se derrama sangue e cusparada
E se trava batalha feroz.
Mais era um ruge-ruge da gota.
Voava tapa e cabeçada, ponta-pé e cocorote.
E no meio daquilo tudo tava o Diabo de um lado, bufando pelas ventas,
E Cristo do outro, vestindo um chorte Voador.
E no bolo tava Zé Pilintra de apito nos dente,
Tentando acalmar toda aquela gente.
De um tamborete de bar gritava o carpinteiro José: “Juiz farizeu, velhaco, sem-vergonho”.
Tomé já nem acreditava no que via.
Cristo empurrando o capeta dizia: “Passe pra cá cabra fedorento, eu sou o dono da bola”.
E o Diabo tinhoso respondia: “Num me empurre não vu!? sou feito casca-vér, quando eu pego, se não mato, aleijo”.
Mais na frente era Pedro que se desentendia
Catucando o fiofó de um malassombro que dizia:
“Eita porterinho desenfeliz, vou te dar uma paimada de mão, que tu vai girar três dias e cair de aner no chão”.
Beu Zebu tava engaiado com Lucas no tabefe.
O lobisomem enfiava a mão no ouvido de Tadeu,
Que depois do golpe pra mais nada o juízo dele deu.
A perna cabeluda que não é besta nem nada,
Foi saindo de fininho pela beira das açoitadas.
“Olha faca e canivete pra depois da partida, é o Real” gritava um moleque ali pelas rudia.
Eu só sei que o jogo acabou na maior gritaria,
E assim foi mais uma partida do Futebol Clube Olaria.

quarta-feira, 26 de março de 2008

Donzelice

Eu queria falar umas coisinhas aqui pra a nova família.
Eu queria falar sobre donzelice.
Procurei num dicionário, e sempre que eu faço isso me decepciono, “Donzelice
1 Estado de donzela 2 no popular Ato mimoso, próprio de moça”.
Outro até piora:
Referente à mulher virgem, pura.
Bom eu vou falar o que eu acho de Donzelice.
Pra mim tudo tem início em 1981, quando duas aspirantes a psicóticas resolvem ter filhos. Ai começa a donzelice. O primeiro nasce no mês das noivas e o outro no mês dos ventos. Todos dois no dia 16. Tem coisa mais donzela que essas coisinha de datinhas tudo iguaizinhas?
Como se não bastasse a donzelice do acaso, as duas ainda criaram os dois donzelinhos como duas menininhas. Era roupinha engomadinha, cabelinho penteadinho, blusinha por dentro da zorbinha e os dois vestidos iguaizinhos. Era uma donzelice.
Carnaval, me perdoe padre, um inferno. Fantasia que pinicava, sapato que apertava, elástico do chapéu fazendo marca no gogó. Os dois fantasiados iguais.
Enfim...
O tempo passou e esses dois donzelos cresceram juntos. Tomaram a primeira cerveja juntos, estudaram juntos pras minhas provas de recuperação, passaram juntos no vestibular, se formaram juntos na universidade...
Mas umas das coisas que eles fizeram juntos, e que passa desapercebido pela maioria das pessoas, por pura donzelice, foi a viagem que esses dois donzelos fizeram para o Estados Unidos em 96.
Essa viagem mudaria drasticamente a vida de um deles.
Era uma dessas exscursões bem donzelas que se faz quando tem 15 anos e que todo debutante donzelo que fazer.
Era um monte de donzelos juntos. Uns vestidos de vermelho, a gente, outros de amarelo, de azul, de laranja, verde. E nesse tumulto policromático teve uma donzela que chamou a atenção desse donzelo.
Veja como a vida é donzela, eles moravam na mesma cidade, freqüentavam os mesmo cantos, mas só foram se esbarrar nos Estados Unidos.
Nunca achei que ele fosse tão persistente. Foi ré internacional, foi ré no western. Western era uma boatezinha bem donzela que todo menino, naquela época, queria ir quando a gente era pequeno.
E de tanta donzelice dele, ela acabou cedendo.
E deu...
Deu certo!
Tem gente que não acredita em amor à primeira vista, mas eu vi de perto isso acontecer.
E vi no dia que ele pediu pra casar com ela em Maria Farinha. Agora to vendo ela casar com ele aqui, na frente de todo mundo.
E não tem nada mais donzelo que vocês aqui, perdendo temo, ouvindo minhas donzelices.
Meus queridos donzelos, eu desejo a vocês TODAS as donzelices mais lindas desse e de qualquer outro mundo.

quarta-feira, 12 de março de 2008

O grande espetáculo da rudia das cores do amanhecer

Um dia eu vi uma rudia colorida,
Grande que nunca tinha visto,
O povo tava chamando de mambembe.
Tinha uma fila que nem me lembro o tamanho,
Era gente de todo canto
Da roça, do largo, da vila, do vale
Tinha gente que nem se sabia por onde contar.
Meninada que dava na canela.
Uma correria, um bate-bate, um rige-ruge
Menino num bota o dedo ai, buliçoso.
Mas mãe, o dele é maior que o meu.
E tu visse mirtinha se banhando no açude?
E eu lá tenho essa sortitude!?
Menina não bula com essa cachorra.
Mas rapais, ó prai, ele nem pra olhar pra mim.
Olha a maçã! Vermelhinha, docinha!
Menino senvergonho, vá pedir dinheiro pra seu pai.
Ô Avilino, vamo sentar na frente pra ver as perna da moça do mágico?
E se ele morder?
O sorvete é baratinho, tem pro senhor e pro seu vizinho.
E a fila foi se correndo feito serpente,
Entrando na rudia, toda aquela gente
Foi encontrando seu lugar nas tauba que rangia quando o povo sentava.
E de repente se escuta um papoco.
Foi Zé Culé, que tinha tomado uns pifão,
Drumiu escorado no candeeiro,
Que tocou fogo no palheiro,
Que pegou no tar do Mambembe.
Foi uma correria danada,
Era home pegado nos pés da santa,
Mulher agarrada no braço do esposo,
Zé do gás se divertia feito pinto no lixo,
Se mijava de rir com tudo aquilo.
A mulher barbada ficou sem bigode no meio do fogaréu,
O macaco queimou o rabo e corria feito um aluado,
O mágico tentava salvar os coelhos de seu chapéu,
O homem grande mas parecia uma madame de tanto que chorava,
A bailarina saiu desembalada na carreira com a saia presa no pescoço,
Um chinela veia torada num pé de um trupicão, a outra ninguém dava fé,
Os peitinho tava de fora fazia tempo,
E o bom palhaço corria pra acudir o anão
Que se embolava no chão pro mode seu cabelo chamuscado.
O elefanta, com a venta, jogava água na cabeleira do leão.
A meninada sentada na grama se ria do acontecido,
Batia palma de cada pipoco quee escapolia,
Cada escorrego era uma gargalhada.
Eita, lá vai o rei da galhofa com a peruca queimada. Gritou Toinho
E foi assim que se deu o grande espetáculo da rudia das cores do amanhecer.

segunda-feira, 10 de março de 2008

Oração do Velho Galego

Meu Nosso Senhor
Atenda minha pobre oração
Que aprende faz tempo.
Tanto tempo que nem mesmo o tempo
Sabe quanto tempo faz.
Me adefenda de todas as bostisses desse e de outro mundo.
Me livre de um baque de uma besta braba
Ou de uma rede velha,
De uma mulher de bigode com um irmão matador,
De um buraco no caminho de minha carroça,
De escorregão no meio da feira,
De uma cachorra me mostrando os dentes pra me dar uma dentada,
Ou de uma dor de dente,
De uma topada na unha incaicada,
De um furúnculo no sovaco,
De uma mordida de macaco,
De picada de cobra peçonhenta,
De ferroada de maribondo,
De um malassombro das casas fortes me tormentando,
De um sol de rachar,
De lata d’água furada quando for na cacimba,
De tarrafa sem peixe
Ou de uma espinha de peixe no gogó,
De bufete no pé-do-ouvido ,
De um bêbado no meu é caído,
De um menino maluvio,
De uma acocorada num pé do urtiga,
De uma pisada num buraco de formiga,
De uma cigarra num dia de ressaca,
De uma coice de uma besta parida,
De um visinho falador,
De um filho chorando de dor,
De uma dor no pé do buxo,
De uma sarnacão no verão
Ou saroumorreu no inverno
Meu Nosso Senhor escutai minha prece
E me livra desse inferno.

sexta-feira, 7 de março de 2008

O desencontro do desencontro numa bostisse matutal

Num desses dias de arrilia,
Em que o sol já nem tem tanta graça,
Se tu se mostra na minha frente
Eu me embolava contigo
Num trupicão de ladeira.
Juntava a minha com a tua besteira
Prumode a gente se engargalhecer.
Terminava encatarrado se chorando
Num apromo de cusparada
Dispois de uma grande bicada.

quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

Travessia celeste de quatro dias e quatro noties

Vinha eu e meu castanho fiel
Cavalgando sob o sol de fevereiro.
No matulão levava um pão que nem o diabo quis amassar
E na jarra uma água guardada, amarga feito fel.

Já fazia bem uns três dias de jornada.
Já fazia bem uns trezentos sonhos sonhados.
Na cabeça a saudade de um amor telúrico
Que martelava o juízo que nem o grito do cancão

Já ia perto de Simbres, nas primeiras léguas de Capibaribe
Quando senti o chão se tremer inteirinho.
Me avoei no chão como quem escapa de bala
E procurei meu punhal mouro para defender o que era meu.

Lá no firmamento vinha uma nuvem de poeira.
Tinha bem uns trinta metros pro céu,
Tinha bem ns trinta metros pros lados.
E era acompanhada de uma zoada de levantar até jumento morto.

Quando aquilo chegou mais perto
O mistério se dismisteriou.
Minha vista se desanuviou
E minha espinhela, na velocidade de um corisco, petrificou.

Era uma revoada de cobras celestes
Que tinham asas nas costas e esmeraldas nos olhos.
Cada escama tinha a marca dos Reinados Agrestinos,
Cada dente tinha marcas dos Reinados Sertanejos.

Tinha pra mais de sete mil serpentes.
Era tanta cobra que minha vista nem alcançava o fim.
E pelo visto ia tudo atravessar o pobre do Capibaribe
Naquele galope desenfreado.

Quando as cobras entraram na água
O rio se dividiu na metade.
Era as cobras passando desavisadas do Capibaribe
E o Capibaribe dividido no meio da quantidade de serpente.

Forma quatro dias e quatro noites de travessia.
Eu e o castanho já estávamos perdendo a paciência
Quando notamos que a revoada já estava acabando.
Perto de umas duas léguas vinha quem aquilo estava pastorando.

Era uma aparição de causar estranheza.
Que não se pode ver no mundo dos viventes,
Que não se pode ver n mundo dos morrentes.
Uma santa profana vinha montada no galope num galho de cajarana.

A comitiva passou sem me notar.
Não levei nem uma mordida, picada ou susto
Graças a Santa do galho de Cajarana
Eu hoje posso esse causo contar.

Pelos séculos e séculos,
Amém!